A canção escorreu pela minha pele
como dedos de alguém que nunca conheci
mas amei desde sempre.
A voz, ferida, funda,
entrou-me pelas costelas
e acendeu o quarto onde escondo o que sou.
Não chorei por tristeza,
chorei por excesso,
por ter dentro de mim mais mundo do que cabe na carne.
Todos os corpos que não abracei
dançaram ali, ao som daquela música,
e cada nota era um nome que perdi.
Sou feito dessa travessia:
não de palavras, mas de gestos que falharam o tempo certo
e no entanto, continuam a tocar-me,
como se me dissessem:
“ainda estás vivo, ainda és abrigo.”
A música passou, mas o silêncio ficou cheio dela
e eu, com os olhos marejados,
sabia:
não era o tempo que chorava em mim,
era o Divino, disfarçado de lembrança.
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