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domingo, 27 de julho de 2025

A Colmeia / J.M.J.

A abelha voltou com o corpo inclinado,

as asas incertas, um traço de néctar estranho na língua.

As outras sentiram o odor do desvio,

não era perfume, era fermento.

 

No limiar, duas guardiãs cruzaram as patas:

a entrada não é para quem cambaleia.

Aqui dentro dança-se em harmonia,

e os mapas do voo não toleram desvios.

 

Mas quem disse que o erro é uma essência?

Que o tropeço é sentença perpétua?

Ela não sabia

e provou o néctar sem pressentir o abismo,

voou torta, sim, mas voltou. Voltou.

 

O que é uma colmeia sem memória do regresso?

Sem espaço para o reencontro com o eixo?

Quem vigia a entrada sem vigiar o coração

talvez proteja a estrutura,

mas esqueça a alma do enxame.

 

A justiça mais alta não mora na expulsão.

Ela pergunta:

ainda sabes dançar com as outras?

ainda trazes luz no pólen, mesmo que trémula?

 

A abelha espera,

não pede perdão e oferece presença.

Já não está embriagada, está só,

e espera que alguém, entre o zumbido e o instinto,

se lembre que a embriaguez não é eterna

e que há gestos que salvam mais que protegem.

 

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