Ele nasceu com o silêncio colado à espinha,
como se os muros do mundo falassem baixo demais
e só ele os soubesse escutar.
Desde cedo, soube que havia dores sem nome,
ventos que passavam por dentro,
e vozes que não eram suas
mas lhe habitavam o peito.
Trazia dentro uma antena fina,
capaz de captar o grito antes do som,
a lágrima antes do rosto,
o sufoco antes do ar.
Ninguém lhe ensinou a decifrar o indizível,
mas ele aprendeu,
como quem aprende a sobreviver;
escutando o que não se diz,
sentindo o que não se mostra,
traduzindo o que nem o próprio mundo entende.
E assim,
com os olhos voltados para dentro
e as palavras nascidas da respiração ferida,
fez-se ponte,
fez-se espelho,
fez-se voz dos que nunca puderam falar.
Não foi o destino que o feriu,
foi a própria vida que lhe confiou
o dom mais raro;
carregar no corpo uma dor que é chave,
e com ela
abrir portas que só o silêncio sabe onde estão.
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