Há pais que tocam nos filhos
com as mãos que nunca os tocaram.
Passam o rigor que receberam,
como se amor fosse disciplina,
e afeto, silêncio.
Outros calam-se diante da ternura,
não por falta de sentimento,
mas por nunca a terem visto com rosto.
Herdaram a rigidez como se fosse sangue,
e pensam que dureza é proteção.
E há filhos que crescem a mendigar olhar,
que aprendem a falar pelos gestos,
a desejar por dentro, calados,
o abraço que nunca veio.
Tornam-se adultos com buracos de infância
que ninguém vê,
mas que governam tudo.
Alguns repetem,
outros rompem.
Uns erguem muralhas,
outros tornam-se ternura pura,
como se a falta tivesse ensinado
a urgência do carinho.
E há um dia, às vezes tardio,
em que esse filho, já homem,
abraça alguém e sente que
pela primeira vez,
abraça a criança que foi.
E nesse instante,
sem que ninguém o saiba,
um ciclo ancestral se quebra.
E o amor, enfim,
começa.
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