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sábado, 26 de julho de 2025

Herança Invisível / J.M.J.

Há pais que tocam nos filhos

com as mãos que nunca os tocaram.

Passam o rigor que receberam,

como se amor fosse disciplina,

e afeto, silêncio.

 

Outros calam-se diante da ternura,

não por falta de sentimento,

mas por nunca a terem visto com rosto.

Herdaram a rigidez como se fosse sangue,

e pensam que dureza é proteção.

 

E há filhos que crescem a mendigar olhar,

que aprendem a falar pelos gestos,

a desejar por dentro, calados,

o abraço que nunca veio.

Tornam-se adultos com buracos de infância

que ninguém vê,

mas que governam tudo.

 

Alguns repetem,

outros rompem.

Uns erguem muralhas,

outros tornam-se ternura pura,

como se a falta tivesse ensinado

a urgência do carinho.

 

E há um dia, às vezes tardio,

em que esse filho, já homem,

abraça alguém e sente que

pela primeira vez,

abraça a criança que foi.

 

E nesse instante,

sem que ninguém o saiba,

um ciclo ancestral se quebra.

 

E o amor, enfim,

começa.

 

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