Existem dias em que o corpo não dói,
mas a alma já se despediu em segredo.
Não é tristeza,
é outra coisa,
como quem arruma a casa
sem esperar visitas,
mas também sem pressa.
Não se deseja o fim,
mas também não se resiste.
A vida continua,
mas sente-se uma cortina
a descer devagar
nos bastidores do peito.
Tudo o que foi feito
parece suficiente,
ou então,
já não importa.
Não é culpa,
não é cansaço,
é uma aceitação mansa,
como quem entende que não é preciso
gritar para ser ouvido
num lugar onde o silêncio já sabe o nome.
Sente-se o mundo a girar
mas de fora,
como se já se estivesse
num outro lado de dentro.
E isso,
estranhamente,
não assusta.
É quase leveza,
como se o peso
da própria exigência
tivesse finalmente sido devolvido.
Se vier a partida,
virá sem ruído.
Mas enquanto não chega,
há ainda o gesto,
a palavra,
a escuta.
Há ainda um lugar
para pousar os olhos
e dizer:
estive aqui
e fui inteiro,
mesmo quando parti aos bocados.
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