Fui silêncio antes de tudo,
antes do ferro e do fumo.
Antes das cidades e das fronteiras,
eu era torre viva do tempo.
Raízes fundas nas entranhas do mundo,
ramos estendidos a tocar estrelas.
Falei com a chuva,
dancei com o vento,
acolhi ninhadas, amparei o musgo,
partilhei a seiva com irmãos distantes
numa língua que o homem esqueceu.
Cresci devagar,
porque só os eternos sabem esperar.
Cada anel no meu corpo era um século,
cada sombra que projetei,
um gesto de compaixão.
Então vieram...
não com preces,
mas com dentes de aço e pés cegos
e cortaram-me ao meio como quem abre o ventre do mundo
à procura de poder.
Subiram ao meu cadáver
como reis sobre um trono de ossos,
sorriram, tiraram retratos,
sem ver que posavam sobre a morte.
E eu, caída,
ainda escutava,
ainda sentia o chão a tremer
com o grito dos outros;
das aves sem ninho,
dos fungos sem sombra,
dos rios sem margens.
Mas não chorei.
As árvores não choram,
elas resistem na memória de quem ama a Terra.
E hoje, falo por ti que me escutas,
por ti que sentes a ferida,
não como uma culpa,
mas como um chamamento.
Protege o que resta,
planta o que falta
e nunca mais deixes que a ignorância
suba ao altar da vitória.
Porque cada árvore viva
é um pacto com o tempo
e cada árvore caída,
um aviso do futuro.
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