As prateleiras estão cheias,
e as mãos, vazias,
e o forno já se prepara
para queimar
o que devia alimentar.
Quinhentas toneladas de urgência
convertidas em fumo diplomático.
Alimento embalado para a fome
destinado ao esquecimento higiénico
nos depósitos do império.
Trump cortou,
Rubio sorriu,
e Musk… contou poupanças,
enquanto os corpos definhavam
sem saber que a salvação
estava estacionada em Dubai.
Falam de validade,
de protocolo,
de segurança alimentar,
mas não há segurança
quando se governa com bisturis cegos
e se elege o cinismo como ministro.
Este mundo
onde se queimam calorias
em vez de as dar,
merece ser sacudido
com a raiva de mil estômagos vazios.
Que incinerem também os discursos,
as promessas com paladar a plástico,
as bandeiras que tapam silêncios
e o orgulho de quem destrói ajuda
em nome da eficiência.
Fome não tem prazo,
nem passaporte,
tem olhos,
tem ossos
e ouve o crepitar dos biscoitos
a arder no forno da indiferença.
(Este poema nasceu da indignação perante a destruição anunciada de quase 500 toneladas de alimentos destinados à ajuda humanitária, biscoitos de alto valor energético, fundamentais em contextos de fome extrema, armazenados em Dubai, e agora condenados à incineração por “proximidade do prazo de validade”.A alegação de “protocolos” não apaga a violência de um sistema que prefere desperdiçar alimentos do que rever prioridades políticas.Num tempo em que milhões enfrentam a fome, esta decisão é mais do que desperdício: é um crime moral.
Escrevo, por isso, não apenas para lamentar, mas para acusar.
Porque há silêncios que também matam.)
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