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terça-feira, 29 de julho de 2025

Oráculo de Persépolis (Na fala daquela que sabe o peso do véu) / J.M.J.

Não esperem trovões.

O fim não virá em gritos ou explosões.

Ele começa onde ninguém olha:

no suspiro contido,

no passo que não se repete,

na recusa mansa de obedecer.

 

Eu sou uma entre milhões.

Não carrego armas,

mas tirei o véu

e nesse gesto, tirei também

o peso dos séculos.

 

Fui ensinada a calar,

a baixar os olhos,

a andar ao lado das paredes,

mas aprendi a ver no escuro,

e no escuro vi que nós somos mais.

 

Eles vigiam,

gravam,

punem,

mas já não nos moldam,

porque há algo mais forte do que o medo:

a certeza de que merecemos o ar.

 

Os homens que antes batiam no peito

já não sabem o que defender

e os filhos que educaram para a guerra,

agora escrevem poemas nas paredes da cidade.

 

Não esperem invasões,

nem promessas,

nem salvadores.

 

O que vem aí, vem de dentro;

é o corpo inteiro do povo

a despertar sob as ruínas do silêncio.

 

E quando tudo cair,

não digam que foi o tempo,

ou a política, ou os deuses.

Digam que fomos nós,

as que caminham descalças

sobre brasas antigas,

e não se queimam mais.

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