— Quem és tu, que respiras no fundo do meu peito,
quando o mundo dorme?
Que voz é essa que rasga o silêncio,
como se fosse carne?
— Sou o que deixaste para trás,
o que não coube nos dias claros,
o que mastigaste em segredo
quando ainda tremias.
Carrego as tuas vergonhas,
as escolhas sem escapatória,
as promessas quebradas nos becos
onde ninguém viu.
— Por que vives em mim como um espinho antigo?
Se já me prostrei mil vezes ao arrependimento...
— Porque arrependimento não é entendimento,
e tu pediste que eu desaparecesse
mas nunca me escutaste,
fizeste de mim um inimigo,
mas fui o escudo e o punhal
e o grito que te salvou da mudez.
— E se agora eu não fugir?
E se agora eu te olhar nos olhos?
— Então deixarei de ser monstro
e passarei a ser força,
e serei corpo de trovão
que protege o que te é sagrado,
serei o passo que não treme,
a sombra que te devolve a luz.
— Agora sabes:
o limiar é dentro,
e o guardião,
és tu.
(Todos carregamos dentro de nós uma parte que tememos, o monstro, a sombra,
o guardião do limiar entre o conhecido e o desconhecido.
Este poema é um convite para olhar de frente para essa presença interior,
acolhê-la e reconhecer nela não um inimigo, mas uma força que protege e
transforma.
Que este diálogo interno nos inspire a aceitar todas as nossas partes, e
que possamos caminhar com coragem, integridade e liberdade.)
Sem comentários:
Enviar um comentário