Não sou só ventre,
nem berço,
nem canto doce à cabeceira.
Sou também
o pânico da madrugada,
o silêncio quando ninguém responde,
a porta que não sei abrir.
Houve um dia
em que o corpo disse sim
antes da alma estar pronta
e outro em que a alma quis
mas o mundo disse não.
Fui mulher antes de ser mãe
e às vezes nem isso consegui.
Tive medo,
não de amar,
mas de não saber como.
Disseram-me que toda a mãe ama.
Mentiram
ou esqueceram as que amam em
segredo,
as que se afastam para proteger,
as que deixam porque não têm
o que dar;
na roda do convento,
no cesto do hospital,
no escuro de um beco,
deixei um nome sem nome,
um grito sem voz,
uma esperança sem morada.
E rezo,
não a um deus,
mas a quem o acolha.
Se alguém o chamar filho
com verdade,
se o olhar como eu sonhei e não
pude,
então talvez, um dia,
ele me perdoe
por não ter ficado.
(Dedicado às mulheres
que não conseguiram ser mães como
sonharam.
Que foram vencidas pelo medo,
pela solidão ou pela ausência de
chão.
Que carregam em silêncio o
arrependimento
e o trauma de não terem ficado.
Que o tempo as abrace, sem
julgamento.)
Sem comentários:
Enviar um comentário