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quinta-feira, 24 de julho de 2025

Recado deixado à margem do tempo / J.M.J.

Houve um tempo em que o ar parecia mais denso,

as horas, mais compridas que o corpo,

as noites, povoadas de vozes que não se calavam

e tudo parecia inclinar-se para dentro,

como se o mundo inteiro respirasse com dificuldade.

 

Nesse tempo, alguém caminhava

com os ombros pesados de silêncio,

mas com a lucidez de quem sabe

que há dores que não se curam, apenas se atravessam.

E esse alguém atravessou.

 

Fez-se vigia de memórias,

zelador de raízes partidas,

guardião de laços invisíveis.

Não fugiu à vertigem de sentir,

não recusou a tarefa de cuidar

e mesmo sem garantias, permaneceu,

mesmo sem retorno, amou.

 

Se agora lês estas palavras,

é porque o tempo já passou,

a tempestade baixou,

ou talvez o olhar se tenha habituado à sua dança.

O que importa é que o coração que resistiu

não se perdeu.

 

Ficou este rasto,

não para ensinar,

mas para lembrar:

há vidas que são faróis,

não pela luz que projetam,

mas pelo modo como ardem.

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