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segunda-feira, 7 de julho de 2025

A Mulher que o Sistema Temeu / J.M.J.

Eles construíram muros,

ergueram cidades de pedra sobre os ossos das mães,

inventaram deuses com barba e espada

para esconder a face da Deusa.

 

Chamaram fraca

àquela que sustém o mundo com sangue e silêncio,

chamaram histérica

àquela que sente as marés antes que o mar se levante

e chamaram impura

àquela que guarda a chave da renovação.

 

Mas o que temiam

não era o corpo, nem o riso, nem o ventre,

era o caos sagrado,

era o modo como ela morre e renasce

sem pedir licença ao tempo,

era o modo como os seus olhos

vêem o que os homens tentaram esquecer.

 

Temeram o ventre,

porque ele é o abismo onde o controlo se desfaz,

temeram o sangue,

porque ele diz a verdade que os livros rasgaram,

e temeram a voz,

porque ela não fala, convoca.

 

Eles quiseram fazer dela propriedade;

criaram leis, dogmas, cercas, véus,

ditaram-lhe o lugar:

ao lado, atrás, abaixo,

mas nunca no centro.

 

E no entanto,

ela foi sempre o centro,

mesmo quando exilada,

mesmo queimada,

mesmo silenciada nos arquivos da história.

 

Ela está no desabrochar da primeira flor

e no último sopro de uma mãe que parte,

ela vive na medula dos mitos esquecidos,

nas sacerdotisas que o fogo não apagou,

nas palavras que ardem por dentro

sem ainda terem sido ditas.

 

Não é a mulher que volta,

é o mundo que se lembra.

E desta vez,

não virá com espadas,

mas com raízes,

 

com olhos que atravessam as máscaras,

com mãos que sabem tecer futuro,

com úteros que guardam trovões.

 

Eles tiveram medo,

porque ela é o que não se doma,

porque nela mora Deus,

não como rei,

mas como mistério.

 

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