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segunda-feira, 14 de julho de 2025

Quando o Silêncio se Quebrou / J.M.J.

Foi num dia sem datas,

sem bandeiras,

sem anúncio.

 

Apenas os sons de sempre;

o chilrear,

o ganido,

a vibração do solo molhado

de formigas em alarme,

a ganharem outro peso.

 

Não era magia,

nem ficção científica,

era linguagem,

estava ali desde sempre.

 

O olhar do cão que fica à porta,

a fuga do pássaro antes do tiro,

o mugido antes da faca,

tudo era aviso,

tudo era fala.

 

Nesse dia,

ficámos nus,

porque ouvimos o que não quisemos ouvir.

 

Não "eu amo-te",

mas:

"Dói."

"Foge."

"Pára."

"Estamos a desaparecer."

 

As árvores falaram

com as suas raízes trémulas,

as baleias cantaram

com mapas de dor desenhados nas ondas,

e até os ratos nos túneis

sussurraram histórias

de medo e adaptação.

 

A vergonha não foi imediata;

primeiro veio a recusa,

depois o espanto,

e só então,

a escuta.

 

Agora,

quando um corvo pousa e fita,

já não se pensa superstição,

pensa-se mensagem,

intercâmbio.

 

Ficámos mais pequenos,

mas mais verdadeiros,

porque não somos os únicos com voz,

apenas fomos os últimos a escutar.

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