Seguidores

domingo, 13 de julho de 2025

O Macho Ferido / J.M.J.

Chamam-lhe homem,

mas treme perante uma mulher livre.

Ergue a voz, mas não tem verbo

para enfrentar um olhar que não se curva.

 

Quer ser rei,

mas só num reino onde as mulheres rastejam,

quer ser forte,

mas só ao lado de quem nunca o contradiga,

quer ser macho,

mas só se ela calar, cuidar, baixar os olhos

e fingir que ele é Deus.

 

O seu falo não é carne, é símbolo vazio,

pendurado na ideia podre

de que dominar é o mesmo que amar.

Grita “tradição”, “família”, “valores”,

mas tem medo,

medo de ser medíocre sem a sua criada emocional,

sem a inocente amordaçada que o chame de senhor.

 

Querem mulheres virgens, mudas, inexperientes,

não por pureza,

mas porque não suportam ser comparados.

Fazem do útero prisão,

do amor contrato,

do lar cela.

 

E entre eles, riem,

batem no peito,

e chamam-se “reis”, “alfa”, “homens de verdade”,

mas escondem, no fundo,

o desejo mal resolvido de outros corpos duros,

outras vozes que os validem como machos,

num ritual homoafetivo que não ousam nomear.

 

Não é amor o que sentem,

é pânico de não se sentirem nada,

por isso querem silenciar quem os revela,

por isso precisam de mulheres cativas,

e de homens iguais a si para bater palmas.

 

Mas nós estamos a vê-los

e vamos nomeá-los,

e vamos queimá-los,

não com ódio,

mas com a verdade que tanto temem,

porque não há virilidade no domínio,

nem honra no medo,

nem homem onde não há coragem para mudar.

 

 

(Vivemos um tempo estranho. Num país onde tanto se lutou pelos direitos das mulheres, onde tanto se avançou em nome da liberdade e da igualdade, e assistimos agora a um fenómeno alarmante: uma juventude seduzida por discursos misóginos disfarçados de masculinidade tradicional.

Cada vez mais, jovens, muitos ainda adolescentes, seguem influenciadores nas redes sociais que promovem uma visão do homem como dominador e da mulher como propriedade emocional, sexual e doméstica. Querem mulheres submissas, ingénuas, sem voz crítica, que não os desafiem nem os façam sentir inferiores. Não procuram amor, procuram espelhos quebrados onde não se vejam.

Mas esta nova masculinidade não é força, é medo.

Medo de serem comparados.

Medo de não serem suficientes.

Medo de que a liberdade feminina revele a pequenez da sua identidade.

Medo, acima de tudo, de encarar a própria fragilidade, a insegurança, a incapacidade de amar sem dominar.

É aqui que nasce o "complexo do falo" coletivo: homens que só se sentem viris se a mulher for frágil, calada, dependente. E que muitas vezes se refugiam, inconscientemente, em relações homoafetivas encobertas, em rituais de validação entre pares masculinos que negam o afeto, mas exalam desejo. Não há problema nenhum na homoafetividade, o problema está em usá-la como esconderijo de uma masculinidade falida.

Estes homens não odeiam as mulheres, odeiam-se a si próprios por precisarem delas para se sentirem homens.

E por isso tentam rebaixá-las, domesticá-las, silenciá-las.

 

Esta nota, este poema, este grito, é um espelho e uma denúncia.

Não contra os homens.

Mas contra a mentira da masculinidade que muitos continuam a carregar como couraça podre.

A quem isto incomodar: talvez seja porque lhe serve.

A quem isto doer: que seja um começo.

Aos homens verdadeiros: não tenham medo de se despir do papel para serem presença.

Às mulheres: nunca deixem que vos calem.)

 

João 

Julho de 2025

 

Sem comentários:

Enviar um comentário