Seguidores

segunda-feira, 14 de julho de 2025

A Incoerência da Fé Conveniente / J.M.J.

Ao longo da história, a relação entre o ser humano e o divino tem sido marcada por paradoxos profundos. No cristianismo, como noutras tradições religiosas, propõem-se valores como o amor incondicional, o perdão, a humildade e a renúncia ao egoísmo. Contudo, é frequente observar que muitos crentes seguem apenas as partes da doutrina que lhes são convenientes, ignorando o desafio ético e espiritual que esses ensinamentos impõem.

 

Cristo é invocado em momentos de angústia, pedido como intercessor de milagres, mas o seu exemplo de vida, o amor ao próximo, a entrega sem reservas, a compaixão por todos, é muitas vezes esquecido no quotidiano. A fé transforma-se assim numa prática utilitária, onde o divino é solicitado como remédio para as dificuldades, mas raramente procurado como modelo de vida e transformação interior.

 

A multiplicação da devoção aos santos, especializados nas mais diversas áreas da vida humana, saúde, trabalho, proteção, reforça esta visão prática e fragmentada da fé. Cria-se, assim, uma relação de expectativa, em que Deus e os santos são acionados em função das necessidades do momento, sem que haja um verdadeiro compromisso com a profundidade espiritual que o cristianismo propõe.

 

Esta incoerência revela uma desconexão essencial: os valores fundamentais da mensagem cristã são frequentemente substituídos por uma religiosidade superficial, moldada pelo interesse imediato. O cristianismo, que deveria ser um caminho de profunda transformação do ser, é muitas vezes reduzido a uma lista de pedidos e favores, esquecendo-se que a verdadeira fé exige entrega, coerência e uma mudança radical do coração.

 

No fundo, a prática religiosa torna-se, para muitos, um reflexo dos seus próprios medos e desejos, mais do que uma busca genuína pela verdade e pelo bem. A fé, quando reduzida a este nível de conveniência, perde a sua capacidade de elevar o ser humano para além de si mesmo, aprisionando-o, antes, nas suas próprias carências.

 

O desafio permanece: reencontrar, no meio da incoerência, o sentido original da fé, não como instrumento de troca, mas como caminho de libertação e autenticidade.

Sem comentários:

Enviar um comentário