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terça-feira, 15 de julho de 2025

Demasiado humano / J.M.J.

Sou feito de ar e de espanto,

de carne que treme

e silêncio que pensa devagar.

 

Não sou dono do que me move,

o coração pulsa sem que eu mande,

os pulmões respiram

como quem reza em surdina,

e o corpo age, mesmo cansado,

como um servo fiel da vida.

 

Inteligência não é cálculo,

nem resposta rápida,

é um dom que habita o musgo,

o voo das aves,

a espera da semente na terra.

A natureza sabe,

não pensa,

mas sabe.

 

Eu, humano, duvido,

e na dúvida, falo,

e no verbo, crio mundos

que me confundem.

 

Preciso de pão,

de abrigo,

de um olhar que me reconheça,

preciso do outro

para ser eu;

sou dependente,

sou inacabado,

sou procura.

 

A consciência não me veio com o nascimento,

ela cresceu nos tombos,

nas perdas,

nas perguntas que ninguém respondeu.

 

Vivo entre o grito do desejo

e a voz do dever,

o drama entre o querer tudo

e o saber que não posso.

Id e superego,

num duelo sem fim

entre o fogo e a norma.

 

E no meio,

um sopro que pede sentido,

uma liberdade que não se mede

em leis ou slogans,

mas na forma como toco o mundo

sem o ferir.

 

Tudo é cultura,

tudo é mutável,

Mas há algo,

algo que permanece

quando o ruído cessa.

 

E é nesse espaço

que talvez habite a verdadeira inteligência:

aquela que sabe calar,

amar,

e continuar a respirar,

mesmo com o coração aberto.

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