No coração verde da Bacia do Orinoco,
quando o mundo já calara um povo,
restava um papagaio,
de penas antigas
e voz encantada.
Falava no vazio
palavras que ninguém entendia,
não eram ecos de homem,
mas sopros de ausentes,
sussurros de almas queimadas no esquecimento.
Atures, dizia o vento,
e o pássaro respondia,
como quem sonha no idioma da infância
e acorda sempre no fim de uma era.
Não foi o guerreiro,
nem o padre,
nem o conquistador
que guardou a língua,
foi a ave.
Um guardião de penas,
último poeta de um vocabulário condenado,
entoando sílabas
que já não pediam pão,
mas lembrança.
Humboldt escutou
e escreveu
quarenta sementes sonoras
antes que o tempo as devorasse de vez,
como quem colhe fogo
na boca de um rio.
A ave morreu,
mas a língua não.
Não toda.
Alguma parte de mundo ficou,
na escrita,
na memória,
na lenda.
E hoje,
cada palavra esquecida
pode renascer no bico de um milagre
se houver quem a escute
e quem a ame.
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