Dormia antes do bronze,
da palavra,
da pedra saber que era templo.
Nas entranhas geladas do mundo,
uma semente sem flor nem memória
esperava, sem pedir tempo.
Nem sonhava.
Sabia apenas ser silêncio
em suspensão perfeita,
entre o nada e o talvez.
Quarenta e seis mil invernos
sem se mover um gesto,
dar por extintos os tigres,
saber que os homens viriam
para queimar o que resta.
Mas veio o degelo,
não como dilúvio,
mas como respiração,
e o calor, o toque
fez pulsar de novo o que era pó.
Moveu-se
devagar,
como quem acorda de um sonho de Deus
e procura nos próprios contornos
a razão de ainda estar aqui.
Diz-se que é minhoca,
mas é mais do que isso:
é uma pergunta,
um eco reanimado,
a prova de que há coisas
que nem o tempo consegue matar.
Talvez os glaciares tenham boca,
e esta seja uma das vozes
a dizer-nos:
“nem tudo está morto, apenas à espera”.
E se há vida que hiberna milénios,
então há dor, há luz, há sabedoria
à espera também,
e espera o humano em ti
pelo degelo certo.
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