Meu amigo, meu irmão de alma,
meu igual na força e no riso,
a terra levou-te, e comigo levou
uma parte que nunca mais poderei tocar.
O teu riso ecoava em mim como torrentes
que não secam, e agora só há silêncio.
Cada passo que dou, sinto a tua sombra
a guiar-me e a ferir-me ao mesmo tempo.
Como suportar estar só,
quando o mundo se abriu em tua ausência?
As estrelas parecem mais frias,
os ventos mais pesados,
e até o sol hesita em aquecer meu peito.
Se alguma vez fomos apenas amigos,
que os deuses me perdoem:
pois não há amizade que consuma a alma
como esta chama que me arde por ti.
Volta, Enkidu, ao meu lado,
ou deixa-me pelo menos viver
com a tua lembrança como escudo,
como espada, como abraço que nunca cessa.
Meu coração chora rios que não param,
meu corpo procura a tua forma na noite,
minha voz clama contra a injustiça do mundo,
porque o que fomos juntos foi mais que vida:
foi essência, foi plenitude, foi destino.
Mesmo sem ti, respiro teu espírito,
aprendo com a tua coragem, sigo tua memória,
e nas pedras antigas, nos rios e no vento,
sei que partes de ti permanecem em mim,
como se o amor tivesse tomado forma eterna.
(Este poema busca traduzir a intensidade emocional e
espiritual da relação entre Gilgamesh e Enkidu, como apresentada no Épico de
Gilgamesh. Mais do que uma amizade comum, o vínculo entre eles é retratado como
uma união profunda da alma, marcada por lealdade, admiração e amor que
transcende categorias modernas de relação.
O luto de Gilgamesh pela perda de Enkidu revela a
dimensão humana da dor, da vulnerabilidade e da transformação interior. Ao
escrever este poema, procurei captar tanto a devastação da perda quanto a força
que emerge do luto, refletindo a busca universal de significado, identidade e
conexão diante da finitude da vida.
Embora o texto original não explicite sexualidade, a
intimidade emocional entre os personagens inspira uma leitura aberta, onde a
intensidade do amor, da amizade e da devoção se sobrepõe a definições rígidas.
O poema é, portanto, um convite à reflexão sobre amizade, perda, memória e
transcendência.)
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