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domingo, 3 de agosto de 2025

Mentira que Não Dói / J.M.J.

As pessoas não querem a verdade,

antes um consolo com voz doce,

um engano bem vestido

que não arranhe as paredes do ego.

 

Preferem a mentira que embala

à luz que cega;

a ilusão que acaricia,

à clareza que sangra.

 

Vivem de olhos fechados,

porque abrir é ver ruínas,

é encarar o vazio

onde juraram haver sentido.

 

Dizem:

“Dá-me qualquer coisa em que acreditar,

mesmo que seja farsa,

mas que me poupe o abismo.”

E não percebem que o abismo

é justamente o que pedem,

com cada crença escolhida pela comodidade,

com cada dogma colado como penso.

 

Mentem a si mesmos

com a fé que não transforma,

o amor que não escuta,

a justiça que protege o seu reflexo.

 

E assim,

alimentam a besta,

dão de beber à sombra

e chamam-lhe bem.

 

A verdade?

Ela está ali, imóvel,

sem adornos,

sem promessas,

mas ninguém quer dançar com ela,

porque não perdoa ilusões,

nem oferece anestesia.

 

Preferem a mentira,

porque a verdade,

a verdade exige coragem.

 

 

(Este poema nasce a partir de uma frase de Sigmund Freud: “Nada é mais facilmente acreditado por nós do que aquilo que, sem referência à verdade, vem ao encontro de nossas ilusões carregadas de desejo.” A partir dessa reflexão, explorei poeticamente a tendência humana a rejeitar a verdade quando ela fere, e a preferir a ilusão confortável que mantém intactas as narrativas pessoais.

É um espelho levantado à condição contemporânea, onde a mentira, se for doce, é preferida à verdade que exige confronto, responsabilidade e mudança. Mais do que uma crítica, este poema é um convite à coragem interior: a coragem de ver, de aceitar e de crescer para lá do conforto da mentira.)

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