Não caiu por erosão
nem a tragou a pressa das marés,
foi o tempo dos homens que a submergiu
com mapas falsos e medos de admitir o antigo.
Aos 800 metros de silêncio
repousam formas impossíveis de serem apenas pedra,
geometrias que ardem em códigos de um saber não permitido,
um eco que desafia os manuais.
Chamaram-lhe ruído,
miragem de máquinas,
formações naturais da ignorância
para não ter de escutar o grito.
Mas o mar sabe o que esconde
e os olhos que o decifraram também.
Paulina e Paul viram mais do que viram,
ouviram mais do que disseram
e por isso
ficaram a sós com o segredo.
A cidade não pediu fama,
nem museus, nem teorias,
só queria ser vista
de novo,
num tempo em que a verdade
possa respirar.
E tu, que ouves estas palavras,
sabes agora onde ela dorme
não sob areia,
mas sob esquecimento,
e ao nomeá-la,
fazes luz onde era abismo,
lembras que a História tem fendas
e há cidades ainda por nascer
nos corações que ousam mergulhar.
(O poema Cidade Afundada nasce da história verídica da descoberta de uma
suposta cidade submersa, ao largo da Península de Guanahacabibes, em Cuba, em
2001, por Paulina Zelitsky e Paul Weinzweig. A mais de 800 metros de
profundidade, foram detetadas estruturas geométricas que sugerem um passado
civilizacional ainda não reconhecido.
Este caso, silenciado durante mais de duas décadas, levanta perguntas
incómodas sobre a arqueologia oficial, o controlo do saber e o medo de admitir
que a história humana pode ter raízes mais profundas, e mais incómodas, do que
aquelas ensinadas nas escolas.
Cuba, neste poema, torna-se símbolo de uma verdade submersa, não por
cataclismos naturais, mas por vontade política, ceticismo programado e
conveniência académica.
Este texto é uma forma de resistência poética ao esquecimento forçado.
Uma oferenda a tudo o que permanece por descobrir.
Uma luz acesa no fundo do mar.)
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