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domingo, 3 de agosto de 2025

A Salvação Debaixo dos Pés (Poema inspirado na descoberta da saponita) / J.M.J.

Não serão os céus a salvar-nos,

nem máquinas douradas

que devoram o tempo e vendem futuro.

 

A resposta

estava no chão.

 

Na terra pisada,

no pó que se cola aos dedos,

no barro dos pobres,

na argila sem nome

que o mercado ignorou.

 

É ali,

na câmara secreta dos minerais,

que a memória da terra

aprendeu a respirar por nós.

 

Uma colher

carrega um campo de futebol,

não em peso,

mas em poros,

em silêncio,

em espera.

 

A saponita não grita,

não exige,

não consome,

apenas acolhe

o que o homem exalou sem pensar.

 

CO,

fantasma do progresso,

é sugado sem violência,

sem máquina,

sem altar.

 

A argila é templo da simplicidade,

diz-nos:

“Vocês olham para cima,

mas é cá em baixo que se perdoa.”

 

E talvez um dia,

quando os satélites se cansarem

de vigiar o colapso,

alguém olhe para o chão,

e veja ali,

num punhado de pó,

a redenção.

 

 

(Este poema nasce do assombro provocado por uma descoberta científica recente: a saponita, uma argila comum e abundante, revelou-se capaz de capturar dióxido de carbono de forma simples, barata e natural.

Enquanto o mundo procura soluções tecnológicas cada vez mais complexas e dispendiosas para travar o colapso climático, a resposta, como tantas vezes, repousava no chão, esquecida.

Há nesta argila silenciosa um símbolo: o retorno ao essencial, à terra, à escuta.

“A Salvação Debaixo dos Pés” é, pois, mais do que um comentário a uma inovação; é uma ode ao invisível que sustenta, à humildade da matéria, e à possibilidade de redenção através do que o mercado não vê: o simples, o pobre, o barro.)

 

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