Não serão os céus a salvar-nos,
nem máquinas douradas
que devoram o tempo e vendem futuro.
A resposta
estava no chão.
Na terra pisada,
no pó que se cola aos dedos,
no barro dos pobres,
na argila sem nome
que o mercado ignorou.
É ali,
na câmara secreta dos minerais,
que a memória da terra
aprendeu a respirar por nós.
Uma colher
carrega um campo de futebol,
não em peso,
mas em poros,
em silêncio,
em espera.
A saponita não grita,
não exige,
não consome,
apenas acolhe
o que o homem exalou sem pensar.
CO₂,
fantasma do progresso,
é sugado sem violência,
sem máquina,
sem altar.
A argila é templo da simplicidade,
diz-nos:
“Vocês olham para cima,
mas é cá em baixo que se perdoa.”
E talvez um dia,
quando os satélites se cansarem
de vigiar o colapso,
alguém olhe para o chão,
e veja ali,
num punhado de pó,
a redenção.
(Este poema nasce do assombro provocado por uma descoberta científica
recente: a saponita, uma argila comum e abundante, revelou-se capaz de capturar
dióxido de carbono de forma simples, barata e natural.
Enquanto o mundo procura soluções tecnológicas cada vez mais complexas e
dispendiosas para travar o colapso climático, a resposta, como tantas vezes,
repousava no chão, esquecida.
Há nesta argila silenciosa um símbolo: o retorno ao essencial, à terra, à
escuta.
“A Salvação Debaixo dos Pés” é, pois, mais do que um comentário a uma
inovação; é uma ode ao invisível que sustenta, à humildade da matéria, e à
possibilidade de redenção através do que o mercado não vê: o simples, o pobre,
o barro.)
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