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domingo, 31 de agosto de 2025

Sham’el – Luz que revela o oculto

Sham’el, sol que atravessa sombras,

portador da luz que desperta o que jaz escondido.

Não julga, não força, não fecha ciclos;

mostra o caminho com consciência e dignidade.

 

Entre mundos visíveis e invisíveis, caminha,

trazendo clareza sobre padrões antigos,

sobre sementes que germinam no silêncio da alma,

sobre verdades que apenas a coragem permite tocar.

 

Não teme tempestades nem a escuridão interior,

pois sabe que cada desafio é convite à transformação.

A luz de Sham’el não consome, ilumina;

não impõe, liberta; não destrói, desperta.

 

No entrelaçar de caminhos, nomes e símbolos,

Sham’el recorda:

a verdadeira força reside em conhecer, sentir

e trazer à luz o que estava oculto,

para viver com autenticidade, liberdade e amor.

 

O Canto dos Nefilins

E os Vigilantes desceram, não por soberba,

mas porque o Amor os puxou para a terra.

Não suportaram ver os filhos dos homens

na solidão da carne,

no cansaço do pó.

 

Vieram não com espadas,

mas com olhos cheios de ternura,

trazendo consigo segredos do céu:

o brilho das estrelas,

a música dos ventos,

o mistério da seiva que sobe nas árvores.

 

E uniram-se aos humanos,

não por desejo de domínio,

mas porque o coração pede encontro.

E nasceram os Nefilins,

altos em espírito e corpo,

filhos da ponte entre o barro e a luz.

 

Mas Javé, o ciumento,

chamou-lhes maldição.

Ergueu a sua voz como trovão,

não para os acolher,

mas para os separar.

Chamou-lhes gigantes,

chamou-lhes abominação,

e selou os céus contra os pais

que ousaram amar.

 

Contudo, a terra não esqueceu.

O sopro dos Nefilins ficou gravado

nos rios, nas pedras e nos sonhos.

Pois eles foram o testemunho

de que até os anjos podem chorar de amor,

e que não há queda

quando a descida é feita pela ternura.

 

E assim se cumpriu o segredo:

os “caídos” não caíram,

desceram.

E a maldição não era deles,

mas da boca que temia

o poder da união.

Reflexos do Vazio

Destruir.

Sempre destruir o que não se pode possuir,

arrancando do mundo o brilho que fere,

como se retirar pétalas pudesse apagar a flor.

 

Negar.

Afastar-se da verdade que incomoda,

erguendo muros de falsidade sobre o que ilumina,

como se o mundo precisasse de censura

para caber dentro de olhos estreitos.

 

Insultar.

Gritar contra o que desperta desejo,

como se palavras pudessem matar o que reluz;

um acto silencioso de inveja que ecoa no vazio.

 

No íntimo, não há culpa:

apenas o reflexo frio de quem teme a própria sombra,

projetando escuridão sobre tudo o que não é seu.

 

O mundo observa, implacável.

E aqueles que caminham plantando sombras

não percebem que a única prisão

é a que carregam dentro de si.

 

 

 

(Poema inspirado na frase de Honoré Balzac: “É tão natural destruir o que não se pode possuir, negar o que não se compreende, insultar o que se inveja.”)

Não Precisam de Cruz

A floresta já é templo,

as cachoeiras já são salmos,

as árvores erguem-se como colunas

onde o vento celebra a missa do invisível.

 

O povo que dança à beira do fogo rito,

não carece de cruz imposta,

porque a vida pulsa neles

como um evangelho mais antigo

do que qualquer livro escrito.

 

O que chamam de “salvação”

é apenas outra corrente,

uma máscara de ouro

sobre o rosto da mesma violência.

 

Eles já conhecem o sagrado:

vive na seiva,

no canto dos pássaros,

na memória das avós

que transmitem, sem altar nem dogma,

a eternidade da floresta.

 

Não lhes roubem a alma de novo.

Respeitem o que não precisa ser batizado.

O divino não é monopólio,

é rio que corre em muitos leitos,

é chama que não cabe em cálices.

 

Deixem que os povos da Amazónia

sejam donos da própria luz,

pois ninguém precisa de pastor

quando já fala a língua dos deuses.

Entre Sombra e Fogo

Não sou apenas quem penso ser.

Dentro de mim habitam séculos,

códigos invisíveis escritos em genes,

resquícios de vidas que me antecederam,

micro-organismos que sussurram decisões

antes mesmo que eu as perceba.

 

Cada impulso, cada hesitação,

é uma dança de química e memória,

uma teia de forças que me atravessa

como vento antigo a brincar entre folhas.

 

Pergunto quem guia meus passos:

eu ou tudo aquilo que sou

sem jamais ter escolhido existir?

E ainda assim, mesmo no fogo da dúvida,

há um brilho que persiste:

um olhar que escolhe ver,

um gesto que prefere o toque,

uma faísca de consciência

que não pede licença ao universo.

 

Entre sombra e fogo descubro:

liberdade não é dom absoluto,

mas o instante em que reconheço

o que me atravessa

e, mesmo assim, respiro, sinto, existo.

O Que se Oculta

No silêncio do eu profundo,

há rios que correm sem nome,

forças que nos empurram

para onde a mente teme olhar.

 

Desejos velados, sombras dançantes;

ecos de instintos nos atravessam,

e nas fissuras do consciente,

surge o fogo que nos move.

 

Cada fantasia, cada impulso,

não é pecado, mas vida pura,

uma energia que quer ser sentida,

uma chave para o que somos.

 

O que fingimos não ver

não desaparece: habita, insiste, chama.

E só quem ousa reconhecer

descobre o vasto mar que carrega dentro.

 

 

sábado, 30 de agosto de 2025

O Encontro

Há pessoas que entram na nossa vida como tempestades silenciosas.

Tocam-nos de maneiras que não pedimos,

despertam medos antigos, desejos adormecidos,

e fazem-nos sentir simultaneamente mais vivos e mais vulneráveis.

 

Com algumas delas, cada gesto é uma ponte ou um abismo,

cada palavra pode acender luz ou abrir feridas.

A presença é intensa, magnética, quase inevitável,

mas também exaustiva, exigente, capaz até de roubar o fôlego.

 

O coração sabe, antes da mente:

nem todos os encontros merecem permanecer.

Alguns passam para nos transformar, ensinar, avisar,

não para ficar.

 

É nesse delicado equilíbrio entre desejo e preservação

que aprendemos quem podemos deixar entrar

e quem precisamos manter à distância,

não por ódio ou medo,

mas por cuidado com a própria essência.

 

Os Obeliscos

Dentro de nós, cidades ocultas,

anelam-se fios de silêncio.

Pequenos círculos de génese,

a vida escreve novas gramáticas

sem que a ouçamos.

 

Chamam-lhes obeliscos,

torres invisíveis, erguidas na carne,

guardando proteínas

que nenhum livro ainda revelou.

 

Entre dentes e sombras,

entre o sopro e a febre,

reproduzem-se em segredo,

num pacto com bactérias que conhecem

a memória da boca.

 

Serão parasitas?

Serão cúmplices da saúde?

Ou apenas passageiros mudos

num navio chamado corpo?

 

Enquanto perguntamos,

eles já nos habitam,

fundam impérios microscópicos,

talvez preparando

um novo alfabeto da vida.

Âncora

Se não fosse ela,

eu já teria desistido.

Mas há mãos frágeis

que dependem das minhas,

um olhar perdido

que ainda me chama.

 

Sou âncora,

mesmo cansado,

mesmo sem rumo.

Enquanto ela respirar,

o meu fôlego

não me pertence.

A Gravidade do Invisível

Tudo parece cair;

simples, certo, natural.

Mas o chão é apenas promessa,

e o peso que sentimos

é vestígio de um universo que se curva e respira.

 

O espaço se dobra,

o tempo se inclina,

e estrelas, planetas, luz e sombra

dançam ao som de uma música

que mal conseguimos ouvir.

 

Buracos negros engolem luz,

segredos que nem mesmo o olho vê,

e a gravidade, silenciosa,

ordena o caos,

enlaça o visível e o invisível.

 

Talvez, no silêncio quântico,

resida a chave de tudo:

o fio que liga o muito grande ao muito pequeno,

o sopro que une o cosmos inteiro

num único gesto de atração.

 

E nós, corpos frágeis,

sentimos apenas o toque sutil,

o abraço constante,

o lembrete de que nada cai por acaso.

 

sexta-feira, 29 de agosto de 2025

Banquete

Todo o mundo, cedo ou tarde, se sentará

à mesa do que plantou.

 

Há sementes que germinam no silêncio,

ações esquecidas que voltam em vento e chuva,

palavras lançadas como pedras

que quebram caminhos futuros.

 

O tempo prepara o banquete,

cada escolha posta sobre o prato,

cada gesto, cada omissão,

será servido, inevitável, diante de nós.

 

Não há fuga, nem reserva,

tudo retorna, cedo ou tarde,

e aprendemos, entre o amargo e o doce,

que o que semeamos somos nós mesmos.

 

 

(Este poema foi inspirado na ideia de Robert Louis Stevenson, refletindo sobre a inevitabilidade das consequências de nossas escolhas, lembrando que tudo o que semeamos retorna, cedo ou tarde, à nossa própria mesa.)

O Rebanho e o Eco

Há quem se alimente de bordões,

palavras rápidas, afiadas,

discursos que insistem,

como pão seco dado ao rebanho.

 

Mentiras repetidas tornam-se cânticos,

e a cada eco a verdade se perde,

sufocada sob o peso das certezas.

 

"As convicções são prisões",

e vemos as grades erguerem-se

naqueles que juram ser livres.

 

O fanatismo veste-se de coragem,

mas nasce apenas da fraqueza,

dos que não ousam pensar,

dos que temem a dúvida, como fogo.

 

E assim seguem, de olhos fechados,

aplaudindo quem os engana,

odiando quem os desperta.

 

Mas um dia, quando o chão ceder

sob o peso das ilusões,

talvez compreendam:

o rebanho não pensa, apenas marcha,

e quem se recusa a ver a verdade

está já meio morto.

 

 

(Inspirado no pensamento de Nietzsche, este poema é um alerta contra o fanatismo e as certezas inabaláveis que cegam o rebanho. Uma chamada para pensar, questionar e recusar as mentiras que nos são servidas como verdades.)

O Último Fogo

Havia quase ninguém.

O mundo se dobrava em frio, fome, caos.

Restavam mil, mil e poucas almas,

sobreviventes de uma terra que quase os esqueceu.

 

O vento levava tudo: florestas, rios, horizontes.

O sol queimava ou não aquecia.

E eles caminhavam, frágeis,

mas o último fogo recusava-se apagar.

 

Cada olhar carregava o peso de todos os que se foram,

cada respiração era resistência,

cada gesto uma promessa:

sobreviver, para que algo do que eram perdurasse.

 

Do caos nasceram genes, escolhas da sorte,

marcas que moldariam o futuro, invisíveis,

silenciosas, mas determinantes.

E dessa escassez extrema,

essa humanidade quase extinta aprendeu a persistir,

a pensar, a criar, a amar,

e o mundo, quase vazio, respirou de novo.

 

E desse gargalo genético floresceu o mar que nos fez humanos.

O Vazio

Há um silêncio que mora em mim,

um quarto sem janelas

onde as paredes respiram frio

e o tempo se deita sem pressa.

 

Procuro nomes para preenchê-lo,

mas as palavras desfazem-se em pó.

Procuro rostos, memórias,

mas até elas se escondem do que sou.

 

É um vazio que não grita,

não pede, não reclama.

Apenas se senta comigo à mesa,

olhando-me como um espelho cansado.

 

E, no entanto, nesse espaço árido

às vezes nasce um sopro,

uma centelha mínima, quase invisível,

que me faz lembrar que até no deserto

há sementes que esperam pela chuva.

O Ofício de Despertar

Não trago verdades prontas,

nem carrego dogmas na palma da mão.

A minha arma é a pergunta,

o silêncio que fere,

a dúvida que abre frestas nos muros.

 

Vejo muitos a dormir de olhos abertos,

presas do hábito,

caminhando em sonhos emprestados,

alheios à própria sombra,

mas eu, teimoso, insisto:

acorda, pensa, repara no que te cerca.

 

Não quero seguidores,

nem ecos que repitam a minha voz,

quero apenas consciências em brasa,

almas que se revoltem contra mentiras

e homens e mulheres que ousem ver.

 

Se incomodo, é sinal de vida;

se provoco, é sinal de chama,

e se alguém desperta,

nem que seja um só,

já o mundo respirou diferente.

O Mar se Abriu

As águas sussurravam segredos antigos,

juncos dançavam sob o vento impaciente,

e o povo parou, olhou o horizonte,

onde o impossível parecia respirar.

 

E então, um caminho se abriu,

raso, estreito, iluminado pela fé,

e passos hesitantes tocaram a lama,

cada coração pulsando esperança e temor.

 

Atrás, a sombra da opressão se agitava,

fria, feroz, tentando engolir o passado,

à frente, liberdade chamava com voz firme,

e as ondas, obedientes, se separavam em silêncio.

 

Milagre ou natureza, não importa;

o que importa é o espírito que atravessa,

a coragem que segue, a fé que guia,

 

e o mundo que se transforma

a cada travessia.