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segunda-feira, 21 de julho de 2025

Erguer-se / J.M.J.

Antes dos nomes,

antes da culpa,

antes da ideia de deus,

uma criatura levantou-se.

 

Num mundo sem tronos nem escrituras,

subiu às árvores para fugir,

desceu ao chão para procurar,

e caminhou em pé

como quem desafia o próprio céu.

 

Chamaram-lhe Lucy,

como se a música pudesse batizar ossos,

mas ela não pediu nome,

nem glória,

nem pátria.

Trouxe apenas o gesto

que nenhum animal ousara fixar na terra:

ficar de pé.

 

As mãos ainda sabiam das raízes,

os olhos ainda tremiam perante feras,

mas os pés…

os pés romperam o ciclo antigo,

inauguraram a marcha

que haveria de dar cidades ao barro

e promessas à voz.

 

Não sabia nada de poder,

nem de mercado,

nem de pecado,

mas soube, sem saber,

que erguer-se era o princípio de tudo.

 

A sua morte foi ossos,

mas também profecia:

que um dia nos esqueceríamos

de que o início da humanidade

foi apenas alguém,

anónimo,

em silêncio,

a levantar-se do chão.

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