Um tribunal passou a mão pela testa
e descobriu que o rosto era falso.
A casa estava erguida sobre papel molhado,
as cadeiras ocupadas por sombras,
e a voz que gritava ordem
não tinha nome no registo.
As eleições foram espetáculo
sem lei,
sem corpo válido,
sem povo por dentro.
Os fiéis calam,
os exaustos falam,
chamam-lhe projeto pessoal,
chamam-lhe autocracia,
chamam-lhe Chega.
Agora o líder está nu,
mas ainda finge poder,
como se os gritos cobrissem a nudez
e os aplausos servissem de certidão.
Um partido sem órgãos
é um corpo sem coração,
e o sangue,
meu irmão,
começa a coagular no centro do medo.
Não há mais desculpa processual,
nem cortina ideológica,
nem povo cego,
há um rasto de fraude que fede
até nos corredores do palácio.
E se o povo souber,
se escutar o estalido da casca,
se vir os alicerces a ceder,
quem sustenta o mito?
Um chefe sem trono
é só um homem de megafone
a gritar para ninguém.
(Este poema foi escrito na sequência da decisão definitiva do Tribunal
Constitucional português que invalida as eleições internas do Chega realizadas
em janeiro de 2024, confirmando que o partido se encontra, legalmente, sem
órgãos dirigentes válidos.
Chefe Sem Trono denuncia a fragilidade de um projeto político que se
apresenta como defensor da ordem, mas vive mergulhado no desrespeito pelas
próprias regras. A anulação judicial revela não apenas uma falha técnica, mas
uma estrutura assente na manipulação e na personalização do poder.
As consequências reais desta decisão são graves: o Chega continua a atuar
no espaço público sem legitimidade orgânica, o que fragiliza o seu
posicionamento institucional e expõe o vazio democrático da sua liderança. Na
opinião pública, esta queda de máscara poderá aprofundar divisões internas,
gerar perda de confiança entre os seus apoiantes mais críticos e alimentar o
descrédito de quem já via neste partido mais culto de personalidade do que
projeto coletivo.
Num tempo em que a democracia é testada por dentro, é vital reconhecer: um
partido que não respeita a democracia interna não está preparado para governar
em nome de um povo livre.)
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