Nunca foste a que chamava por mim,
com bolos na travessa
ou histórias a meio caminho da ternura.
E eu, menino cego de afetos evidentes,
fui ficando mais ao colo de quem me estendia os braços
do que ao lado de quem apenas estava.
Agora sei: estavas,
sempre estavas,
na ponta da cadeira,
na sombra dos gestos,
nos silêncios que esperavam sem cobrar.
Hoje, arrependo-me com doçura,
não com culpa,
mas com a lucidez de quem percebeu tarde
a extensão do teu silêncio.
Tinhas a alma frágil dos que não pedem,
o rosto apagado dos que amam sem alarde,
e um coração talvez exausto,
mas, ainda assim, atento.
Nunca soube tocar-te como merecias,
mas deixo-te este poema,
não como desculpa,
mas como presença.
Um gesto demorado
que te chega, enfim,
à medida do que foste:
uma boa alma,
escondida na penumbra
dos dias pequenos.
(Dedicado à minha tia Georgina.)
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