Há dias em que olho para trás
e encontro versões minhas
que já não reconheço.
Homens que caminharam com o meu rosto
mas não com o meu entendimento,
vozes que falaram por mim
antes de eu saber o que desejava dizer.
Foram muitos.
Alguns tenho orgulho em ter sido,
outros mantenho à distância,
como quem folheia um caderno antigo
e não sabe bem se aquilo
foi verdade ou apenas ensaio.
Mas hoje percebo:
não eram erros,
eram estados,
e cada um deles, mesmo o mais torto,
foi um degrau na minha própria casa.
Crescer é isto,
olhar para o que fui ontem
e sentir que já não caibo ali,
que o pensamento mudou de lugar,
que o coração já não responde
ao mesmo toque.
Não é vergonha,
é movimento.
Somos feitos de rascunhos,
e cada dia risca uma linha
na direção do que ainda não sabemos ser.
Somos a água que abandona a margem
não por rejeição,
mas porque o rio continua.
E talvez o mais humano de tudo
seja aceitar esta multiplicidade:
fui muitos,
sou alguns,
serei ainda outros.
E em cada mudança,
mesmo quando dói,
há uma espécie de luz
que se acende devagar;
a luz de finalmente
me tornar inteiro.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.