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sexta-feira, 8 de agosto de 2025

O Espelho Cego / J.M.J.

Há homens

que vestem a armadura

não por guerra,

mas por medo de se verem nus.

 

Homens que falam de honra

com os punhos cerrados

e calam-se

quando o coração treme.

 

Carregam no corpo o peso de um nome,

de uma casa, de um pai,

de uma palavra

que lhes disseram ser o único caminho.

 

Mas há noites em que algo os visita,

não o demónio que imaginaram,

mas uma ternura proibida,

uma lembrança escondida num gesto,

num olhar que durou meio segundo.

 

E então fogem

para os braços de mulheres que não tocam,

para discursos que soam a pedra,

para a multidão que aplaude

sem nunca perguntar:

“Tu... és feliz?”

 

Porque o espelho que carregam

é feito de vidro cego

e nele não se veem,

só um reflexo domesticado,

um vulto que aprenderam a representar.

 

Mas há um dia,

sem idade, sem nome,

em que o corpo já não obedece

e o silêncio antigo na garganta

grita.

 

Grita como quem ama,

como quem quer viver.

 

E ali, entre os cacos do que foi,

nascem homens,

não heróis,

nem mártires,

apenas inteiros.

 

Homens que deixaram de fugir

de si mesmos.

Homens que finalmente

são só,

livres.

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