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terça-feira, 5 de agosto de 2025

O Rosto Queimado do Poder / J.M.J.

Há sempre alguém que aprende

a falar com o ódio dos outros,

alguém que percebe o poder

de apontar, dividir, incendiar.

 

Esse alguém veste a máscara do herói

com as chamas dos desiludidos;

promete ordem,

mas alimenta o caos

como quem doma um animal selvagem

com fome de carne viva.

 

A multidão aplaude,

grita, marcha, destrói

mas não percebe

que a violência é uma roda,

e que quem a põe em movimento

é o primeiro a ser esmagado

quando ela já não precisa de comando.

 

O grupo, desfeito, procura coesão

e no meio da poeira,

procura um corpo onde depositar a culpa.

Não importa o passado,

nem a origem da ruína,

é preciso um rosto,

um só,

para que os outros

possam respirar juntos de novo.

 

E assim, o instigador torna-se vítima,

o orador é silenciado,

o rosto queimado é afastado da praça,

não por justiça,

mas por necessidade.

 

O ciclo recomeça

e outro virá,

mais feroz, mais hábil, mais convincente,

porque o desejo humano não cessa,

apenas muda de alvo.

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