Antes do ar, havia água morna.
Um tambor distante, batia, batia.
Eu era um peixe lento num mar fechado,
e o mundo era um ventre de silêncio redondo.
Mas algo apertava;
um laço, uma sombra enrolada no pescoço.
A luz por vir era uma lâmina,
o futuro, um corte,
a vida, um susto.
Nasci roxo,
não de cor, mas de susto contido.
Trazia o medo em volta do corpo
como quem traz o próprio nome por dentro,
sem ainda o saber dizer.
Gritei sem crer que era grito,
a boca abriu-se para a dor antes do ar.
Desde então,
às vezes, sem aviso, o mundo estreita,
como se as paredes voltassem a fechar-se
e o cordão ainda dançasse à volta da garganta.
Mas respiro,
respiro com a memória de quem já afundou sem se afogar,
respiro com a coragem de quem nasceu de um nó
e cada sopro é uma vitória não dita
sobre um medo antigo,
sem rosto,
mas com um nome:
eu.
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